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A "fada" camareira e o hóspede que sempre tem razão. Será?

 


Por Maria Cristina Lahr

Tempo de leitura: 6 minutos

Acho que já cometei por aqui que sou apaixonada pela governança. Gosto desse lado “bastidores” da hotelaria. Mas, não poderia ser diferente, algumas coisas nesse meio me incomodam bastante. A camareira/arrumador muitas vezes é tida (o) como “fada” já que quase não é vista (o), mas resolve grandes questões: o hóspede sai do quarto todo bagunçado, sujo e, PLIM, quando volta está tudo no seu devido lugar.

Existe muito a se refletir sobre esse primeiro parágrafo e eu convido você que é hóspede, camareira/ arrumador, gestor de governança ou proprietário de meios de hospedagem a me acompanhar nesta reflexão.

 

A camareira/arrumador deve mesmo ser invisível?

Por muito tempo escutei sobre a invisibilidade desse profissional. Sempre me pego pensando no perfil de uma boa camareira/ arrumador: ela (e) deve ser discreta (o), já que entra na intimidade dos hóspedes, deve evitar fazer barulhos, já que os clientes da hotelaria muitas vezes dormem em horários alternativos, precisa ser organizada (o), proativo e assim vai. Conseguiríamos elencar uma porção de conhecimentos, habilidades e valores indispensáveis a uma camareira/ arrumador. Ser invisível, não me cai bem, não entra nesta lista. Sabemos que, desde sempre, a prestação de serviços de limpeza tem pouco valor no Brasil, mas você já pensou na importância dessa função? Tire a gestão e ainda podemos sobreviver, mas tire a limpeza... em dois ou três dias não há mais o que ser vendido em um meio de hospedagem, o lixo já tomou conta dos ambientes e o caos estará estabelecido.

Trocaria invisibilidade por descrição, já que se trata de um profissional de muita importância e por isso mesmo deve ser visto e valorizado como tal. A forma como a gestão se relaciona com as camareiras e arrumadores pode modificar a forma com que os hóspedes se portam com esse profissional.

Assim como as camareiras/arrumadores precisam ser valorizadas (os) pelos hóspedes e gestores é importantíssimo que ela (e) construa suas redes de proteção. É fundamental que esse profissional faça o devido uso dos registros e documentos para se proteger de certas enrascadas.

Vou dar um exemplo: o hóspede do 122 saiu para o trabalho e se esqueceu de retirar a placa de não perturbe da maçaneta da porta. A camareira, Dona Ângela, passou às 10h da manhã e registrou em seu relatório: 122 – PNP – 10h. Antes de sair para o almoço passou no 122 novamente e a placa continuava lá. Então completou em seu relatório: 122 – PNP- 10h e 11h. No fim do expediente visitou o apartamento e mais uma vez o aviso continuava na porta. Registrou: 122 – PNP- 10h, 11h e 15h40.

As 16h20 entregou seu relatório à supervisão, bateu seu cartão e foi para casa. Por enquanto, aparentemente, tudo bem, certo?

Às 18h o hóspede do 122 chegou do trabalho e notou que havia deixado, por engano, a placa de não perturbe posicionada na porta. Puxa, agora seu quarto não estaria limpo nem arrumado e na noite anterior ele havia pedido um jantar no room service e a mesa estava com louças sujas e restos de alimento.

O hóspede retira sorrateiramente a placa da porta e liga na governança para “reclamar” a falta de limpeza. Naquela hora Dona Ângela não estava mais no hotel, no entanto, havia deixado seu relatório. Ao receber a reclamação do hóspede, a governanta verifica os documentos deixados pela Dona Ângela e diz ao hóspede que a camareira havia passado no seu quarto às 10h, 11h e 15h40 e que nesses três horários havia a PNP na porta. Você pode imaginar o que poderia acontecer se esse registro não tivesse sido feito? Provavelmente a governanta ao olhar para o relatório, sem nenhuma informação julgaria que Dona Ângela simplesmente não havia realizado a limpeza no quarto do hóspede e a Dona Ângela iria levar uma bela de uma bronca por isso. E o hóspede sairia com a razão ainda que ele tivesse cometido um equívoco.

Entendam que não estou dizendo aqui que a limpeza não tenha que ser realizada. Mesmo depois do horário, se houver condições, o hóspede esquecido poderá receber a limpeza, mas a Dona Ângela não precisa ser responsabilizada por um erro que não foi dela, concordam?

 

Será que o cliente sempre tem razão?

Certa vez presenciei uma situação em que o hóspede, por achar que a camareira era uma dessas fadas, deixava o apartamento em uma situação vergonhosa: havia roupas espalhadas por todo apartamento, papel higiênico usado jogado embaixo da cama e outras coisas que eu prefiro não mencionar aqui, mas você deve poder imaginar. Certamente esse hóspede achava que por estar pagando pelo serviço de arrumação podia fazer o que bem entendesse. Ao saber da situação o gestor responsável pela camareira, passou a enviar ao hóspede um comunicado sugerindo algumas ações que poderiam facilitar o trabalho da Dona Ângela (não se trata de uma fada com poderes mágicos, estamos falando da Dona Ângela, um ser humano de carne e osso) e a limpeza ser otimizada.

O comunicado pedia para que o hóspede guardasse seus pertences e organizasse seus objetos para que as superfícies pudessem ser devidamente limpas, que jogasse lixo no lixo para que esse pudesse ser retirado. Aos poucos o hóspede foi melhorando as condições do apartamento e consequentemente melhorando as circunstâncias de trabalho da Dona Ângela.

Hóspedes podem e devem ser orientados, lembrados e educados em relação a forma de receber a prestação de serviço. Eles, sem dúvida, são a razão do nosso existir e devem ser respeitados, mas nem sempre eles estão com a razão. Obviamente existem formas e formas de se abordar um cliente que passa dos limites. Uma comunicação amigável pode fazer verdadeiros milagres.

Ao mesmo tempo que os hóspedes podem ser “educados”, é importante que a camareira/ arrumador tenha a consciência de seu papel. Já vi, várias vezes, camareiras/ arrumadores reclamando em alto e bom som da bagunça feita pelos hóspedes. Julgamentos e verbalizações como: “tal hóspede é porco”, aquele outro “nem banho toma” ou então: “devia pagar o dobro para eu arrumar esse chiqueiro” não podem acontecer. O caminho não é o da exposição. O profissional dessa área, como já falamos aqui, deve manter a descrição para que a intimidade dos hóspedes seja preservada. Ajustes de conduta de hóspedes podem ser feitos através de comunicados da gestão.  E não nos esqueçamos, os ajustes da postura dos funcionários podem e devem ser trabalhados através de treinamentos, avaliações de desempenho e feedbacks.

Sabemos que tratar com pessoas, sejam elas hóspedes ou colaboradores não é uma tarefa das mais fáceis. Se você, em seu papel de gestor, tem tido dificuldades na comunicação com seus funcionários ou tem observado atitudes dos hóspedes que são incoerentes ao serviço prestado entre em contato conosco através do nosso e-mail. Teremos muito prazer em conversar com você sobre a comunicação amigável com os hóspedes e podemos pensar juntos em treinamentos e feedbacks para alinhar as atitudes dos seus colaboradores.

Conte conosco!

Um grande abraço e até a próxima;

Cris

Maria Cristina Lahr, a Cris, é hoteleira e atua na docência e na consultoria de negócios hospitaleiros. Saiba mais sobre ela no BeMyGuest, acessando o link.

 

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